TRANSCRIÇÃO

Definição: ação de copiar um escrito; resultado dessa ação. Dentro da História Oral, transcrição é uma das três etapas (transcrição, textualização e transcriação) da confecção do documento escrito. É uma das etapas que constituem o processo pós-entrevista, através das quais se confecciona os documentos de pesquisa. A transcrição, a textualização e a transcriação constituem os procedimentos metodológicos para que o relato oral se transforme em documento histórico. Na transcrição é feita a passagem do oral para o escrito de tudo o que foi gravado. Essa transcrição deve ser completa e o mais rigorosa possível, registrando através de sinais gráficos a interrupção de palavras, frases ou parágrafos e outras características da entrevista. A transcrição consiste numa interpretação ou recriação, pois nenhum sistema de escrita é capaz de reproduzir o discurso com absoluta fidelidade e deve ser realizado o quanto antes, de preferência pelo próprio entrevistador. Ressalta-se, ainda, o cuidado que se deve ter durante a transcrição das entrevistas gravadas.


Histórico: assumindo que a História Oral concretiza-se somente quando chega ao texto, superando a etapa da entrevista e da formação de arquivos, deve haver um processo de transcrição das entrevistas que assegure a formação de um corpo documental a ser trabalhado pelo historiador. A passagem do registro oral para a escrita e a utilização e ou preparação dos depoimentos para publicação aproximam a história de vida do trabalho do biógrafo. O pesquisador torna-se efetivamente um mediador e, embora escrevendo dentro de certos limites, pois deve respeitar a lógica revelada no depoimento, interfere na montagem da narrativa. Os dilemas ocasionados pela transcrição revelam a preocupação justamente com o papel representado pelo pesquisador nessa etapa. De ouvinte passa a intérprete do testemunho, devendo transformar a “fala autobiográfica” em um texto. Sobre os procedimentos para a melhor transcrição não há consenso entre os historiadores que trabalham com história oral. Uns defendem que a transcrição deve manter o máximo de fidelidade ao relato. Outros defendem a necessidade de criar, a partir das gravações, uma narrativa clara e coerente. Na opinião de Lejeune, quem transcreve deve ter a pretensão de não perder, na organização da narrativa, as marcas da subjetividade presentes no discurso oral. Assim, a entonação, as interrupções, além das expressões e gestos, das quais deve ter ainda uma memória o pesquisador/ouvinte na hora de escrever, precisam ser consideradas. Na maioria das vezes se submete ao depoente a narrativa montada a partir das entrevistas, para que verifique sua exatidão e aprove a sua forma. Entre esses dois procedimentos extremos coloca-se uma solução intermediária, que é retocar o discurso para adaptá-lo às regras da comunicação escrita – corrigindo, pontuando, eliminando vacilações e repetições –, mas conservando a lógica do discurso e o ritmo da fala.

Comentário: entende-se ainda que a linguagem falada e a escrita têm valores distintos. Para que o narrador reconheça-se no texto da entrevista, é preciso que a transcrição vá além da passagem rigorosa das palavras da fita para o papel. A transcrição literal, apesar de extremamente necessária, será apenas uma etapa na feitura do texto final, que podemos chamar de “textualização”, por ser ao fim e ao cabo um modo de se reproduzir honesta e corretamente a entrevista em um “texto escrito”. Na textualização, a transcrição é trabalhada, eliminando as perguntas do entrevistador, os sons e ruídos em favor de um texto mais claro. A textualização deve ser uma narrativa clara, onde foram suprimidas as perguntas do entrevistador; o texto deve ser “limpo”, “enxuto” e “coerente” (o que não quer dizer que as “ideias” apresentadas pelo entrevistado sejam coerentes); sua leitura deve ser fácil, ou compreensível, o que não ocorre com a transcrição literal, apresentada por alguns historiadores como “fiel” ao depoimento, porém difícil de ser analisada como documento histórico. A textualização final deve conter em si a atmosfera da entrevista, seu ritmo e principalmente a comunicação não-verbal nela inclusa: emoções do depoente como risos ou choro, entonação e inflexão vocal, gestos faciais, de mãos, ou mesmo do corpo. O texto, ainda, não pode abandonar a característica de originalmente falado, devendo ser identificado como tal pelo leitor.

Autoria: Ana Lígia Trindade

 

Referências

LEJEUNE, P. Memória, diálogo y escritura. História y Fuente Oral, Barcelona, Universitat de Barcelona Pubs, n. 1-2, 1989.

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