ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS

Definição:

Economia dos bens simbólicos é o termo dado por Pierre Bourdieu ao sistema de trocas e contratos que se fazem em forma de presentes, em teoria, voluntários, mas que na prática são obrigatoriamente dados e retribuídos. Trata-se de um sistema de trocas que se coloca em contraposição com o sistema de trocas econômicas (compra e crédito).



 

Histórico: teorizado pela primeira vez por Marcel Mauss em seu texto clássico Ensaio sobre a dádiva, publicado originalmente em 1925, o sistema de trocas e contratos obrigatórios feitos em forma de presentes configura uma das temáticas fundamentais separando as noções de utilitarismo e holismo, ainda bastante presentes nos estudos econômicos e sociais. Em seu Ensaio sobre a dádiva, Mauss abre as possibilidades de conceber um sistema de trocas alternativo ao sistema das trocas econômicas. Com a proposição de um princípio de reciprocidade, obrigação de dar, receber e retribuir, a sociedade aparece na forma de conjuntos de indivíduos, cuja principal atividade é a de perpetuar vínculos interpessoais como um fim em si, e não como uma relação secundária, isto é, como um meio para atingir um fim. No início de sua carreira, Pierre Bourdieu apropriou-se do princípio de reciprocidade maussiano para pensar sobre a sociedade Cabila, na Argélia. No decorrer de sua obra, o autor tentou mostrar como é possível, a partir da mesma temática, “pensar sobre coisas tão diferentes como os desafios de honra em uma sociedade pré-capitalista, a atuação da Fundação Ford ou da Fundação França, as trocas entre gerações no interior das famílias e as transações nos mercados de bens culturais ou religiosos etc” (BOURDIEU, 1996, p. 157).

Comentário: segundo Pierre Bourdieu, a economia dos bens simbólicos (dádiva) difere da economia das trocas econômicas (compra e crédito) por três razões fundamentais. A primeira implica um intervalo de tempo entre o que é ofertado e o que é recebido em retorno, enquanto que a segunda se realiza através do que Bourdieu denomina “toma lá, dá cá”, isto é, o recebimento imediato (ou a promessa de recebimento imediato, no caso de uma ação de crédito) de uma contrapartida ao que é ofertado. Em segundo lugar, a dádiva se organiza através de uma lógica do silêncio. Como diz Bourdieu, “tudo se passa como se nos puséssemos de acordo para evitar de nos pormos explicitamente de acordo a respeito do valor relativo das coisas” (BOURDIEU, 1996, p. 162). A compra e o crédito, ao contrário, baseiam-se em definições explícitas dos termos da troca; em outras palavras, de um contrato expresso. Isso significa dizer que a economia dos bens simbólicos supõe indivíduos que entram num jogo de troca sem a intenção explícita de ganhá-lo. Mais importante ainda: a possibilidade de sair ganhando na troca sequer figura enquanto projeção calculista. Ainda segundo Bourdieu: “nessa economia, ou deixamos o interesse econômico em estado implícito, ou, se o enunciamos, é através de eufemismos, isto é, em uma linguagem de recusa” (1996, p. 165). Em terceiro e último lugar, a economia dos bens simbólicos apoia-se naquilo que Bourdieu denomina reconhecimento: a transfiguração dos efeitos da relação de troca num capital simbólico.

O capital simbólico é uma propriedade qualquer – força física, riqueza, valor guerreiro – que, percebida pelos agentes sociais dotados das cateorias de percepção e de avaiação que lhes permitam percebê-la, conhecê-la e reconhecê-la, torna-se sin]mbolicamente eficiente, como uma verdadeira força mágica: uma propriedade que, por responder às ‘expectativas coletivas’, socialmente constituídas, em relação às crenças, exerce uma espécie de ação à distância, sem contato físico. Damos uma ordem e ela é obedecida: é um ato quase mágico (BOURDIEU, 1996, p. 170).



 

 

Autoria:
Lucas Graeff

Referências

BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: 1996.

MAUSS, Marcel. Sociologia e antropologia. São Paulo: Cosac & Nassif, 2003.

 

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