CONTRA-MEMÓRIA

Definição:

Palavra que aparece em destaque na obra de Michel Foucault, bem como nas de  outros autores contemporâneos, e  está associada a uma mudança de paradigma no saber e fazer história. A preposição contra-, que normalmente é utilizada abarcando a ideia de contradição ou oposição, aqui tem um sentido de amplitude. A história formal ou oficial é geralmente concebida como um lugar no passado, estabelecida em uma sequência temporal, ancorada em fatos históricos, devidamente documentados e comprovados. Na contra-memória, em Foucault, temos fatos que aparecem como elementos discursivos, simbólicos, sujeitos a mutabilidade e a diversidade dos olhares dos pesquisadores. Ao contrapor o “cinza” às reluzentes “cores” da historiografia oficial, propõem um estudo meticuloso e paciente, sobre textos que podem ser reescritos, riscados e embaralhados pelos olhos de quem os lê.



 

O sentido histórico comporta três usos que se opõem, palavra por palavra, às três modalidades platônicas da história. Um é o uso paródico e destruidor da realidade que se opõe ao tema da história−reminiscência, reconhecimento; outro é o uso dissociativo e destruidor da identidade que se opõe à história−continuidade ou tradição; o terceiro é o uso sacrificial e destruidor da verdade que se opõe à história−conhecimento. De qualquer modo se trata de fazer da história um uso que a liberte para sempre do modelo, ao mesmo tempo, metafísico e antropológico da memória. Trata−se de fazer da história uma contra-memória e de desdobrar conseqüentemente toda uma outra forma do tempo (FOUCAULT, 1985, p. ?).

Quando Foucault refere-se à Geanologia, ele afirma que sempre analisa um problema a partir de uma questão do presente, buscando no passado as raízes de sua condição atual. Quanto à pretensa unidade do sujeito, esta se desfaz no trabalho crítico do pensamento sobre o próprio pensamento; pensar diferente em vez de legitimar o que já se sabe. Contra-memória não é, portanto, uma negação da história, mas uma provocação ao estabelecido, um elogio à dúvida, à intranquilidade e aos riscos.

Se continua nos interessando ficcionar o passado, é para nos dotarmos de uma contra-memória, de uma memória que não confirma o presente, mas que o inquieta; que não nos enraíza no presente, mas que nos separa dele. O que nos interessa é uma memória que atue contra o presente, contra a seguridade do presente (LARROSA; SKLIAR 2001, p. 7).

Comentário: Pensador flexível, Foucault,  ao escrever sobre a Arqueologia das ideias,  concede importância à  análise das opiniões mais que do saber, dos erros mais que da verdade e afirma a validade tanto das formas do pensamento, quanto dos tipos de mentalidade. Ideias essas que se refletem  ao deslocamento do trabalho histórico tradicional, do texto para as margens e rodapés, com múltiplos autores e leituras. Finalizando, podemos dizer que o conceito de contra-memória abre uma perspectiva anti-factual, dinâmica e instigante, proporcionando novas visões no campo da Memória Social.



 

Autoria:
Hirã Soares Justo

Referências

FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber: Michel Foucault; tradução de Luiz Felipe Baeta Neves,-7ed. – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 5. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985.
LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

MNEME – Revista de Humanidades (ISSN 1518-3394) é publicação semestral da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Departamento de História (CERES). Disponível em: <http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/mneme/article/view/162>. Acesso em: 21/03/11.

 

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